domingo, 29 de dezembro de 2019

Banda Maravilha garante suporte de espectáculo

A Banda Maravilha e os cantores Calabeto, Dina Santos e Robertinho actuam, hoje, a partir das 16h00, no Centro Cultural Zango das Artes, num concerto de entradas gratuitas, no seguimento de mais uma edição do projecto “Mais Semba Festival”, produzido pela Onart e Fundação Sindika Dokolo.


Segundo João Vigário, da organização, a presença dos artistas no Zango é, também, uma forma de proporcionar arte e cultura fora dos grandes centros urbanos e aproximar os artistas a um público que tem poucas ofertas culturais.
A iniciativa é um “ensaio” do que será o festival anual de Semba, que faz parte das actividades paralelas da Bienal da Paz, que aconteceu em Setembro, em Luanda.
O festival é uma plataforma cultural da Fundação Sindika Dokolo, que se consubstancia na produção de eventos que evidenciam o semba e as variantes deste estilo musical, buscando alcançar a legitimação identitária do género, no contexto da promoção e divulgação da música angolana.
Os organizadores pretendem que seja um evento inclusivo e participativo, considerando o “Mais Semba Festival” como uma plataforma que emerge como uma proposta de promoção, valorização e estudo dos sintomas da cultura angolana.

segunda-feira, 23 de dezembro de 2019

Bonga em grande no Show do Mès e Muzonguê da Tradição

Bonga mostrou, mais uma vez, um talento único em palco, nas últimas edições do ano do “Show do Mês” e Muzongué da Tradição, em actuações onde revelou grande capacidade artística e jovialidade, mesmo aos 77 anos, e que vão ficar na memória de quem presenciou e dos ausentes, pelos relatos.



O cantor, que está em Luanda, desde quarta-feira passada, colocou “fogo na kangica”, de uma forma literal, sábado, no Centro de Convenções de Belas (CCB), no fecho da VI temporada do “Show do Mês”, denominado “Encontro com a Tradição”.
O espectáculo, realizado pela segunda vez fora do Royal Plaza, abriu “as portas ao público” com o instrumental “Bonguinha”, uma proposta do guitarrista Betinho Feijó. A viagem não ficou apenas pela música, em intervalos histórias das vivências entre os dois foram contadas. O artista Jorge Mulumba também juntou-se à festa, ao ritmo dos instrumentos tradicionais.
No encontro, que serviu, ainda, para unir vários segmentos da sociedade, Bonga percorreu temas que marcam o percurso artístico, cujo marco é o LP “Angola 72”, numa “aula magna” de música angolana, encerrada com “Jingonça” e um “assalto ao Carnaval”.



O mesmo tema foi o escolhido para encerrar, no domingo, a última edição deste ano do Muzongué da Tradição, realizada no Centro Recreativo e Cultural Kilamba, numa tarde com alinhamento musical mais reduzido, mas com presença acentuada do público.
A sentir-se em casa e valorizando o espírito das festas dos musseques, Bonga levou ao antigo Salão Maria da Escrequenha os maiores êxitos da carreira. “É bom regressar”, disse, no final do espectáculo, que teve como principais referências temas como “Marika”, “Kisselenguenha”, “Kamacove”, “Kambuá”, “Sambila”, “Fruta de Vontade” e “Homem do Saco”.


Com lotação esgotada, esta edição do Muzongué contou, também, com a participação de Massano Júnior, Lulas da Paixão e Givago, com o acompanhamento da Banda Movimento. O espectáculo abriu com Mister Kim, da Banda Movimento, a interpretar temas de Zé Kafala, numa homenagem a um dos mais destacados trovadores angolanos.
Depois foi a vez de Dorgam mostrar talento em “Zito Monami”, de Clara Monteiro, e Teddy Nsingui reviver alguns solos do Instrumental 1º de Maio. Massoxi e Kintino também actuaram. Embora afastado dos palcos, Massano Júnior brilhou em temas como “Meninas de Hoje”, “Kizua”, “Anami”, “Balabina” e “Sunga Sunga”. Já Lulas da Paixão apresentou como proposta “Pepé”, “António”, “Garan” e “Nga Maka”. O último convidado, Givago, encantou a plateia com “Avô Teté” e “Ramiro”.

domingo, 22 de dezembro de 2019

Êxitos de Carlos Burity revisitados em concerto

Duas gerações diferentes partilharam o palco, no sábado, para encerrarem a III temporada dos Duetos N’Avenida, na Casa 70, em Luanda, com as cantoras Patrícia Faria e Gersy Pegado a unirem as vozes para homenagear, durante duas horas, Carlos Burity.
 












Diferente das anteriores propostas, onde os artistas partilham músicas, neste espectáculo, o último deste ano, as artistas, que despontaram nas Gingas do Maculusso, interpretaram temas do homenageado. 

 

Diferente das anteriores propostas, onde os artistas partilham músicas, neste espectáculo, o último deste ano, as artistas, que despontaram nas Gingas do Maculusso, interpretaram temas do homenageado

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 O concerto abriu com “Maria Alucase”. Depois Carlos Burity subiu ao palco para interpretar “Ilha de Luanda”, sucesso que tem conseguido ultrapassar gerações. A viagem pela obra do homenageado teve como prioridade os sucessos dos últimos 20 anos, deixando temas que nos finais dos anos 1970 e 80 marcaram o artista. A única excepção foi a inclusão de “Liberdade de África”, num alinhamento onde não constaram “Especulação”, “Maria das Bichas” e “Zé da Graxa”, temas que na década de 80 ajudaram a consolidar a carreira de Carlos Burity. O espectáculo terminou com um sucesso do passado, que também consta na discografia actual do músico, “Manazinha”. Porém, êxitos como “Lamento do contratado”, “Tia Joaquina”, “Jingonça do macaco”, “Minga”, “Mukajiami” e “Malalanza” fizeram parte do reportório.




Com Lito Graça, na dicanza e coros, Texas e Mayó, nos solos e baixo, juntou-se Marito Furtado (bateria), Isaú Baptista (solo), Miquéias Ramiro (teclado) e Djanira Mercedes (coros), da Banda Maravilha, para dar vida a esta homenagem em que Chalana Dantas não ficou apenas com a direcção artística, tomou, também, os tambores.


Maneco Vieira Dias, da direcção da União dos Artistas e Compositores, entregou o diploma de reconhecimento ao homenageado e destacou o papel e a importância que teve na afirmação da música angolana. No final, Figueira Ginga, da Zona Jovem, a organizadora, prometeu regressar em Fevereiro do próximo ano com o projecto e continuar a prestigiar artistas nacionais.


O concerto abriu com “Maria Alucase”. Depois Carlos Burity subiu ao palco para interpretar “Ilha de Luanda”, sucesso que tem conseguido ultrapassar gerações. A viagem pela obra do homenageado teve como prioridade os sucessos dos últimos 20 anos, deixando temas que nos finais dos anos 1970 e 80 marcaram o artista. A única excepção foi a inclusão de “Liberdade de África”, num alinhamento onde não constaram “Especulação”, “Maria das Bichas” e “Zé da Graxa”, temas que na década de 80 ajudaram a consolidar a carreira de Carlos Burity. O espectáculo terminou com um sucesso do passado, que também consta na discografia actual do músico, “Manazinha”. Porém, êxitos como “Lamento do contratado”, “Tia Joaquina”, “Jingonça do macaco”, “Minga”, “Mukajiami” e “Malalanza” fizeram parte do reportório.



Com Lito Graça, na dicanza e coros, Texas e Mayó, nos solos e baixo, juntou-se Marito Furtado (bateria), Isaú Baptista (solo), Miquéias Ramiro (teclado) e Djanira Mercedes (coros), da Banda Maravilha, para dar vida a esta homenagem em que Chalana Dantas não ficou apenas com a direcção artística, tomou, também, os tambores.
Maneco Vieira Dias, da direcção da União dos Artistas e Compositores, entregou o diploma de reconhecimento ao homenageado e destacou o papel e a importância que teve na afirmação da música angolana. No final, Figueira Ginga, da Zona Jovem, a organizadora, prometeu regressar em Fevereiro do próximo ano com o projecto e continuar a prestigiar artistas nacionais.

quarta-feira, 11 de dezembro de 2019

Palco do Semba Patrícia Faria

Cerca de um mês depois do lançamento do seu mais recente disco De Kaxexe, a 7 de Outubro,  Patrícia Faria é a proposta para a edição do mês de Novembro do Palco do Semba. Ricardo Lemvo foi a última passagem do projecto, que acontece no Jango da União dos Escritores Angolanos.
Patrícia Faria é uma mulher de múltiplas tarefas, autêntica showoman do semba, intérprete de sucessos antigos como autor Caroço Quente”, “Kibela”, “Triste Amargura”, “Zanga Kalunga”, “Eme Kia” “Papa Wa Jimbidila” e “Cama e mesa” (Pacheco), como os novos temas onde destaca-se “De Kaxexe”, uma versão de “Maximbonbo”.
A cantora cresceu num ambiente musical, ainda criança fez parte das Gingas do Maculussu, fazendo com a mesma a transposição para uma solida carreira no meio musical nacional. Antecederam Kaxexe , os discos Eme Kya (2003) e Baza Baza (2006).
Paty Faria, como também é conhecida, foi a primeira mulher a conquistar o Top dos Mais Queridos com o álbum Emé Kya, obra também premiada como Melhor Produção Discográfica, Voz Feminina do Ano,  e Semba do Ano, no Top Rádio Luanda, assim como o de Melhor Intérprete Feminina no Moda Luanda.
De salientar que em paralelo a carreira musical, tem a Patys Griff, especializada em trajes africanos e angolanos. Licenciada em Direito é advogada de profissão, radialista, e recentemente assumiu a liderança da Casa de Cultura do Rangel Nzinga A Mbandi.
O Palco do Semba é um projecto dos Tios e da Leinunes Áudio e acontece no primeiro domingo de cada mês. Este ano desfilaram no evento  Ricardo Lemvo, Moniz Almeida e Jojó Gouveira, Robertinho, Paulo Flores e Tito Paris, Os Jovens do Prenda, Os Kiezos, Kyaku Kiadaff e Yola Semedo.

Phathar Mak e amigos em concerto no Zango

O rapper Phathar Mak realizou, no passado sábado, no Zango, Viana, um espectáculo, muito bem recebido pelo público local, em que convidou também Os Tuneza, Calado Show, os BMA e Rasheed Meduso.



Rapper cria projecto para aproximar os artistas do público


Fotografia: DR
Numa iniciativa conjunta com a produtora Onart, o espectáculo, realizado no âmbito do projecto “Encontro com a Comunidade”, teve grande recepção pública, mesmo com o atraso de uma hora e problemas com o som. 
Entre os sucessos do rapper, o destaque foi para “Amizade”, “Grande Dia”, “My Real Niggaz ”, “Prova dos 9”, “História”, “Respeito” e “Somente Palavras”, alguns dos quais acompanhados pela banda do artista, constituída pelo DJ Edson (scratch), KD (baixo), Moisés (teclados), Nsango (solo), Jack (bateria), Sensei BJS, Toddi e Heróide (coristas).
A abertura do espectáculo esteve a cargo da dupla BMA, jovens integrantes do movimento hip hop do Zango, que estão a conquistar espaço no mercado. O rapper Rasheed Meduso, filho do cantor Kool Klever, demonstrou que está a seguir os passos do pai, mas com uma linha própria.
Os Tuneza, um dos grupos convidados mais esperados, estiveram à altura da expectativa dos fãs. Cage One foi o único artista anunciado que não actuou, enquanto o humorista Calado Show, que não constava no cartaz, conseguiu “roubar” inúmeros aplausos do público. No final, pela receptividade do público, Os Tuneza e Calado Show mostraram interesse em voltar a actuar no Zango.
A próxima edição do projecto “Encontro com a Comunidade” está prevista para 7 de Dezembro, no espaço Aplausos do Sequele. Para Phathar Mak, é uma oportunidade de aproximar mais os artistas do público. “Não é um projecto limitado apenas ao entretenimento. Queremos ir mais além e chamar a atenção das pessoas para a importância do respeito pela cidadania”, disse o cantor.
A iniciativa, explicou, é sequência de outra, denominada “Encontro com a Periferia”, que o ajudou a ser reconhecido pelo Conselho Nacional de Juventude como o embaixador na luta contra a delinquência juvenil. “O objectivo é levar artistas de referência ao encontro das comunidades, num movimento sociocultural inclusivo”, aclarou o cantor, um dos pioneiros do hip hop angolano.

Filipe Mukenga e Selda criam “laços” em palco



Filipe Mukenga e Selda, duas vozes de gerações diferentes, foram as principais atracções de mais uma edição do projecto Duetos N’Avenida, realizada sábado último, na Casa 70, em Luanda.
Em duas horas, foi feita uma viagem ao percurso artístico de Filipe Mukenga, cantor que no início dos anos 80 propôs um estilo novo ao qual denominou “Nova Música de Angola”, e de Selda, cujo reconhecimento veio do espaço conquistado nos circuitos de música.
Os artistas Mário Gomes (guitarra solo), Nino Jazz (teclados), Jack (bateria), Wilder (baixo) e Yasmane Santos( percussão) fizeram o suporte instrumental. O concerto começou ao som de “Nvula”, inicialmente na voz de Selda a qual juntou-se, minutos depois, Filipe Mukenga.
Depois das saudações, o público ouviu temas como “Balabina”, “Weza”, “Carnaval de Março”, “Lemba” e “Yalta”. Durante a actuação, Filipe Mukenga convidou Katiliana Capindiça, artista que nos últimos dois anos apareceu no circuito nacional, para juntos interpretarem “Fruto Maduro”.
O dueto prosseguiu entre Filipe Mukenga e Selda em temas como “Ndilokewa”, “Aquela Rua”, “Angola no Coração”, “Humbi Humbi”, “Dikixi”, “Eu Vi Luanda”, com a qual encerraram esta edição. O projecto Duetos N’Avenida regressa, depois desta proposta mais ligada ao afro jazz, no dia 14 de Dezembro, com o semba, a ganhar vida, nas vozes de Carlos Burity, Gersy Pegado e Patrícia Faria.
O homenageado desta edição foi o cantor, produtor e compositor Eduardo Sambo, um dos mentores de Figueira Ginga e Chalana Dantas, como director executivo e artístico da Zona Jovem. Embora afastado dos palcos, o artista trabalhou com músicos de referência, como Filipe Zau, André Mingas, Rosa Roque, Afra Sound Stars e Banda Maravilha. Para a geração mais antiga, “A Nave”, como é conhecido, é uma referência.

A profecia traída dos músicos da Dipanda


Um outro leque de artistas desse período, com temas dedicados ao momento histórico, deixaram de ser difundidos a partir de uma certa altura, tais como: David Zé, Urbano de Castro, Artur Nunes, Teta Lando e outros, por razões que, nem mesmo quando o discurso tende a ser de reconciliação, têm explicação.
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Quase todo o cidadão de sã consciência nesta época de celebração nacional espera escutar Mirol, no seu "Independência está a chegar", a dizer que a terra vai resplandecer e ninguém mais vai chorar porque o sofrimento terá fim: o famoso grito "Independência" é quase obrigatório nos anúncios dos festejos do Dia Nacional de Angola, mas poucos sabem que pertence a Manuel Claudino Manuelito, na altura baixista dos Kissanguela. Carlos Lamartine em "Ó dipanda wondo tulakiá" vai na mesma linha do músico invisual Mirol e agradece a Agostinho Neto.
É importante um olhar à sociedade angolana da altura, com os três movimentos de libertação a tentarem ganhar vantagens. Se o MPLA, segundo os entendidos, não estava muito forte no campo militar, levava a melhor no quesito propaganda, tendo a música como arma letal para desmoralizar os oponentes.
Era normal os artistas manifestarem apoio aos movimentos da sua preferência, tal como os adeptos de um clube de futebol, apesar de muitos deles, hoje, afirmarem terem sido sempre do movimento que proclamou a Independência no Largo 1º de Maio, o MPLA, facto que desconcerta Soky dya Nzenze: "Eles sabem quem são. Olhem para as obras e facilmente saberão quem sempre esteve na linha da frente da música de intervenção e os oportunistas."
A nossa fonte apresentou um dado que ajuda a compreender a linha de muitos intervenientes da canção política, com o surgimento dos grupos políticos e ideológicos designados como elementos que compunham a Frente Interna do MPLA, nomeadamente a Organização Comunista de Angola - OCA, os comités Henda e Amílcar Cabral, o movimento estudantil e, mais tarde, alguns elementos provenientes dos CIR - Centros de Instrução Revolucionária, que conceberam a linha de actuação dos artistas e grupos. Como exemplo, do Instituto Industrial de Luanda basicamente emergiram “Os Angolenses”, já “Os Kissanguela” eram mais inclinados aos comités juvenis, enquanto o “Agrupamento Aliança Fapla-Povo” aos CIR. Uma outra corrente de artistas individuais provenientes de Portugal e de um meio mais urbano era ligada à OCA. Todos cantavam em prol do MPLA.
A Unita teve cantores simpatizantes seus em Millá Mello, Katchiungo e Poeira; a FNLA também teve, com destaque para Teta Lando, apesar deste apresentar um discurso mais integrador. Mas a verdade é que a maioria dos músicos assumia a camisa vermelha da família MPLA.
Soky dya Nzenze realça o seguinte: “É importante dar a conhecer que antes desta época a música de contestação ao colono foi marcada com temas como ‘Milhórro’ dos Kiezos,‘Viva Lusitânia’, de António Paulino, ‘Kimbemba’, de Teta Lando, e outras”.
A fonte acrescenta, no entanto, que o tema "Kinjangu", do início do Século XX, já lançava a mensagem de contestação e de aspiração à libertação do jugo colonial. Soky dya Nzenze reforça a relevância de "Viva Lusitânia", que satiriza a presença do famoso paquete e dos turistas: "Eles vêm de longe andando na cidade alegres, enquanto eu estou sem nada”. Segundo Dya Nzenze, algumas pessoas “pensavam que a canção era de afecto ao regime colonial, exaltando os lusitanos ou a empresa de transporte, mas não. Era mesmo revolucionária.”
O Conjunto Nzaji deixou a sua impressão digital, reconhece o nosso interlocutor, referindo-se aos temas “Kaputu”, “Difuimu”, “Deba” e outros gravados na República da Bulgária nos anos 60. Ruy Mingas com "Monangambé", "Xiami" e "Muimbu ya Sabalu" (letra de Mário Pinto de Andrade que fala do filho caçula que foi para São Tomé) integra também o lote de cantores da libertação. Da parceria com Manuel Rui Monteiro, que resultou no hino "Angola Avante", tem ainda "Meninos do Huambo", tema que fala das conquistas da Independência, insinuando que "até as estrelas já são do povo". Filipe Zau e Filipe Mukenga atingiram as mentes dos mais pequenos, cantando que os meninos depois do jantar foram para o quintal cantar e ouvir estórias antigas, num exercício de construção ideológica do Futuro da Nação.
O compositor de "Malalanza", interpretada por Carlos Burity, diz que o jovem Zecax, pouco citado e tocado nos dias da celebração da Independência, com “Colono ua Tujiba”, provavelmente instrumentalizada pelo Luanda Show e lançada depois da morte do nacionalista Pedro Benge, também deve ser colocada, historicamente, na primeira linha das canções de intervenção. “Este tema de contestação é muito forte, um grito para que os colonos deixassem a nossa terra e recordava amigos assassinados e presos pelo regime salazarista. Depois do 25 de Abril, a morte de Pedro Benge inspirou vários artistas”, reforça a nossa fonte.

Mais canções
Em contacto com a discoteca da Rádio Nacional de Angola, numa pesquisa por concluir, encontramos mais de 500 músicas com título e referência ao 11 de Novembro e à Independência Nacional. Destacamos aqui o Conjunto Bela Negra, Conjunto Estrela do Povo, de Malanje, liderado por Makú, e a orquestra Os Malucos; quanto aos artistas individuais mencionamos Prado Paim, Belita Palma, Mauro Nascimento com “Dipanda dya Ngola”, “Canção do Homem Novo” e “Cambuta”; Matadidi com “Obrigado Agostinho Neto”, André Mingas com “Pecado em Novembro”, Rui Mingas com “Mamã Terra”, Carlos Lamartine "Rumo à Independência” e Joy Artur “Xietu ya Tambula".
Mencionamos ainda Zé Agostinho com “Noite Longa”, Gimba com "Ofeka yetu Ombembwa (Spínola)”, Nito Nunes com “Ngola Kiluanji”, El Belo com “Ekongelo” e “Hoje é dia de revolução”, Elias  dya Kimuezo com “Dipanda didi diolo kuiza" e "São Nicolau" e Zé da Onda com “Vitória”. Da longa lista, que não caberia neste espaço, trazemos para aqui ainda Cajó Pimenta,Tonito, Artur Adriano, Tanga, Buarque, Camarada Bidon, Zé Viola e Carlos Burity.
Passada a fase da forte carga política, outras composições surgiram e aqui o destaque vai para "Novembro", uma composição de Carlos Ferreira "Cassé" interpretada por Eduardo Paim, de que retemos: "Novembro chegou, com o dia da liberdade"... Importa salientar que deste período, nos estúdios da RNA podemos encontrar outros registos na mesma linha e nem mesmo os cantores piôs deixaram de cantar temas da Independência. "Ngola", dos Kafala Brothers, mostra o lado determinante dos trovadores, com forte presença da Brigada Manguxi.

Os instrumentais
As referências não ficam apenas pelas vozes. Não é por acaso que "Angola Popular" é um instrumental dos Kissanguela, com solos de Nito, hoje artisticamente Belmiro Carlos. O grupo tem ainda o tema "Solos de Maqui".
Outros registos nessa linha são, do agrupamento Os Anjos, "Angola Rumo ao Socialismo", marcado pelos solos de Jajão,  "Avante Juventude" e "Benguela Libertada", de Boto Trindade, "Brinde", de Vinicius Júnior, dos Angolenses, e "Rufo da Liberdade", de Zé Keno.

"Não canta política"
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Waldemar Bastos foi assertivo ao cantar e eternizar o alerta da "Velha Chica": "Xê menino, não fala política", seguido do suspiro de alívio: "Já posso morrer, já vi Angola Independente".
No entanto, para quem está ciente da história da música popular urbana angolana, a vontade de ir para o além sem o esclarecimento de determinadas narrativas é preocupante. "Velha Xica", tema do álbum "Estamos Juntos", lançado anos depois da Independência, pode ajudar na reflexão de um olhar sobre a namorada Angola, muito e tão bem cantada. O cantor que celebra a Independência com a realidade vivida pela Velha Xica, preconiza o mesmo com os ventos da democracia. Curiosamente, Waldemar Bastos há muito que deixou de cantar a canção "Velha Chica", mas na terra que a anciã viu finalmente Independente, e que obviamente é também a sua, ele acabou por conquistar, este ano, o Prémio Nacional de Cultura e Artes na categoria de Música, talvez um indicador para que "Velha Xica" volte a ser cantada e ouvida mais vezes na terra que o cantor carrega na muxima.

Discos fundamentais
Três LP que marcam a época em referência e ajudam a compreender o uso e a função social da música e dos artistas, são "Independência", "Angola Ano 1" e "Mutudi ya ufolo", respectivamente de Teta Lando, Carlos Lamartine e David Zé. Os discos foram gravados pelo conjunto Os Merengues, na altura o "dream team" da música angolana, onde pontificavam Carlitos Vieira Dias, Zé Keno, Zeca Tirilene, Vate Costa e Joãozinho Morgado, dentre outros instrumentistas afectos à CDA-Companhia de Discos de Angola, detentora dos Estúdios Norte.
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Teta Lando - LP Independência. Com mensagens para a união e o combate ao racismo, presentes em canções como "Ame o teu irmão", "Angolano segue em frente, "Pele Negra" e "FNLA e MPLA", este LP foi considerado Disco de Ouro. Nele constam as canções "Cecília", "Lulendo Mpaxi", "Luvuvamo", "Lembele Lembele", "Poto Poto - Barro" e "Menina de nove anos". Facto digno de realce e bastante revelador, na contracapa deste disco está uma imagem de Holden Roberto.
Teta Lando, então com forte inclinação à FNLA, deixou o país depois da Independência, tendo regressado em 1987 aquando do Fenacult.  Mais tarde tornou-se presidente da UNAC, sendo tido no seio da classe como bastante conciliador.
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Com sucessos como "Dipanda wondo tula kiá", Carlos Lamartine, com "Angola Ano 1", álbum histórico com apenas 100 exemplares prensados, faz um forte apelo à Independência, mas difere do disco de Teta Lando porque faz uma clara exaltação aos feitos do MPLA. O artista,  no tema "Etu tuana Ngola tua solo kia", primeiro do lado A, diz que "nós, os filhos de Angola, já escolhemos o nosso Movimento, que é o MPLA".
"Faço-te este apelo, camarada", "Zambi Zambi", "Muiji imoxi imoxi" ("Um só Povo, Uma só Nação"), "Guia para a libertação de África" e a comovente "Zuatenu milele ia xikelela" ("Vistam-se de panos pretos"), completam o lado A. No lado B encontramos "Ngola Kiluanji", "Acorda Lumumba",  "Ngana Ngana fuma ia diala ngongo", "Ene ando builée" ("Eles hão-de se cansar"), "Ene adia losso" ("Eles querem comer tudo") e "Uengi bualaié".
Um outro tema que marca  o cancioneiro de Carlos Lamartine, na altura - 1975/1976 - também membro da organização juvenil do MPLA, é "Pala ki nu a bessa ó muxima", um hino à liberdade, como é possível auferir numa tradução livre de Soky dya Zenze, que simplificou do seguinte modo: "Para acalentar os vossos corações, venho cantar aqui, não preciso do vosso dinheiro e estou aqui sentado para que digam que esta vida não é uma brincadeira. Paguem as vossas dívidas, olha quem desperta-vos é vosso amigo". 

Trio da Saudade
Por limitação de espaço, do considerado Trio da Saudade optamos pelo impactante LP "Mutudi ya Ufolo" ("Viúva da Liberdade"), de David Zé, um mukuaxi, expressão patriótica que significava "dono" da terra. "Esta palavra também era uma espécie de senha, aqui em Luanda, para os jovens das zonas libertadas como o Cazenga, Rangel, Golfe, Calemba e mais tarde o Sambizanga", segundo Dya Zenze.
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David Zé, depois de cimentar a sua posição no meio musical, sendo dos mais requisitados para concertos, com vários singles lançados, no limiar da Independência optou também pela música de cariz político-revolucionário. Nesta obra, "Mutudi ya Ufolo", encontramos "Mana ku dile", "As cinco nações", "Ngongo nua Ngola", "Tribalismo", "Ufolo", "Katete njila", "A luta continua", "Mona ku jimbe manhenu", "Undengue Uami", "Nguma" e "Kamba djami". Um grande mobilizador de massas, daí o facto de ter sido comissário político das ex-FAPLA, esteve na origem do Agrupamento Aliança Fapla-Povo, conjunto que produziu todo um manancial de temas musicais com forte carga ideológica de apoio ao regime vigente. David Zé, Urbano de Castro e Artur Nunes, com a sua arte musical, conquistaram não apenas a população mas também a classe política dirigente com temas como "Revolução de Angola", "Ua ué Muangola", dentre outros. O trio também deixou marcas no início do processo de transição para a independência, apelando à união dos movimentos de libertação nacional e depois arremessando balanços harmônicos aos oponentes do MPLA. As suas mortes trágicas no processo subsequente ao 27 de Maio de 1977 não podem ser apenas consideradas impactantes na canção revolucionária, mas também como um revés com efeitos duradouros na música, em particular, e na cultura angolana, em geral. 
David Zé, Artur Nunes e Urbano de Castro, antes da fase FAPLA-Povo ainda apresentam nas suas letras alguns rasgos a propor a unidade entre os três movimentos. Em "Guerrilheiro", David Zé canta: "Se ês do MPLA interessa a todo Mundo, se ês da FNLA também já interessa a alguém e se ês da UNITA tambem já interessa a alguém, um só Povo uma só Nação, abaixo a desunião".
Urbano de Castro em "Rumba Negra" e "Angola África" evidenciam igualmente este lado, de acordo com Soky dya Nzenze. "Com o slogan 'Urbanito angolano' e a resistência ao uso da identificação portuguesa, Urbano de Castro quando jovem já era uma pessoa politicamente consciente, com carácter, convicto e decidido", realça o nosso interlocutor.

"Obrigado Camarada"
Matadidi Mário não apenas cantou a Independência e a fase da revolução. Foi um revolucionário no cenário musical angolano. O nosso “James Brown from Kinshasa”, com a sua Orquestra Inter-Palanca, expressou em temas como "Obrigado, Agostinho Neto (11 de Novembro)" e "Volta Camarada", a mensagem mobilizadora para os angolanos residentes no Zaire (actual RDC), e não só. "Bakokosa po bakosa" ("Mentir por mentir") e tantas outras canções marcam este período. O seu companheiro Diana Spray, com "Angola Nova" e "Valódia", também não pode ser esquecido.
Santocas, com "Massacre de Kifangondo" e "Heróis serão vingados", não esconde o seu lado de cantor-militante do MPLA. Santos Júnior, um outro grande senhor da canção revolucionária, consolidou a sua posição no conjunto Kisanguela com temas como "Estrangeiro", "Atu mu jiba", e outros.
"Os Angolenses", que surgiram após o 25 de Abril de 1974 na Escola Industrial Oliveira Salazar, também tem uma posição marcante na música feita nos primórdios da Angola independente. "África do Magreb ao Zimbabwe", que fala da implementação do poder popular em África e o fim do imperialismo, "Alegria pela via escolhida", "Obrigado Camarada Presidente", "Obscurantismo e miséria jamais", "Internacionalistas", "Mua Ngola mua vulalela" e  "Continuação da nossa luta" são algumas canções com as quais Armando Ferreira, Nelson Costa, Vinicius Júnior, Titino Massano, Pitra Neto, Chico Coio, Celino Bonzela e mais tarde Dulce Trindade, Zecax, Alfredo e outros definiram a sua posição na história da canção independentista.
Os Kissanguela, ou Kisangela, como pudemos encontrar em duas capas de discos do grupo, fazia parte das deslocações oficiais do Presidente da República de Angola. Com Mário Silva como vocalista principal, Fató, Tollingas, El Belo, Calabeto, Santos Júnior, Artur Adriano, Tonito, Avozinho, Candinho, Tino dya Kimuezo e outras vozes que marcam a canção revolucionária do MPLA, exaltavam os feitos do Partido-Estado e atacavam os opositores, existentes ou eventuais. Escute-se "MPLA ueia", "Nvunda ku África", "Tua kua fua" e "Ministro gatuno" (uma referência a Samuel Abrigada, ministro das Finanças pela FNLA no Governo de Transição). O nome Kisangela foi atribuido por Elias dya Kimuezo.
Agrupamento Aliança-Fapla Povo. Outra referência e um viveiro de artistas, o Trio da Saudade (David Zé, Urbano de Castro e Artur Nunes) despontou nesta formação que emergiu no maquis e depois estabeleceu-se na urbe integrando músicos de outras formações, como Chico Montenegro, Carlos Timóteo "Calilii", Mauro do Nascimento, Hildebrando de Jesus, Habana Mayor, Nandinho (Nanutu), Massy, Robertinho, Prolétario, Pepetito e Nonó Manuela, dentre outros hoje consagradíssimos.
Poucos hoje relacionam Carlos Burity e Pedrito com a canção política, no entanto eles também deixaram marcas suas nos tempos do fervor revolúcionário. Burity com "Liberdade África" e "Meu povo usa caminhar", enquanto Pedrito com "África" e "Gika" fazem uma ruptura. Carlos Burity tem em "Maria das Bichas" e "João da Graxa" outros marcos no quesito crítica social. Por seu lado Pedrito, em "Militante" e "Senhor Director", critica a corrupção, a falta de coerência e de autoridade, dentre outros males já então vigentes.
Se Toy Salgueiro ganha visibilidade com "Tentativas", que fala das dificuldades para manter o lar, é Santocas que faz uma autêntica virada, optando pela crítica social com fortes laivos de sarcasmo. Depois de se consagrar com os impactantes "Valódia", "Massacre de Kifangondo" e "Heróis serão vingados", recupera o espírito de “Bairro indígena” e surge  revigorado com "Marçal" e "Matrimônio". Importa salientar que, já na época da Dipanda, em “Poder Popular" Santocas corajosamente afirmava: "O poder popular é a causa dessa confusão"...

Bonga: amor e ódio 
Resultado de imagem para Bonga angola 1972Bonga, também conhecido como Zeca do Marçal, o velocista e homem dos Kisueias, onde também despontava Carlos Lamartine, é outra voz que muito cantou em prol da Independência.  O seu disco "Angola 72" espelha um jovem insatisfeito com o estado de coisas: "Balumukeno" é um grito de despertar para a luta contra o jugo colonial. "Paxi ni ngongo", "Mona ki ngi xiça", "Uengi dya Ngola" e os demais temas deste álbum são de consumo obrigatório para a compreensão não apenas da obra de Barceló de Carvalho, como do uso da canção como inspiração de luta. Depois da Independência Bonga representou Angola em vários palcos, até um período de muita frieza das suas relações com o poder instituído em Angola, marcado sobremaneira pelo disco "Reflexão", publicado em finais dos anos 1980, e agravado com a sua participação na campanha eleitoral da UNITA em 1992. Bonga é uma das vozes que mais cantou em prol da Independência, Democracia, Liberdade e outros anseios dos angolanos, através de sátiras ou recados de forma contínua, influenciando assim várias gerações de angolanos.
As mensagens do músicos que cantaram a dipanda com todo o fervor revolucionário tinham um denominador comum, magnificamente sintetizado por Mirol há mais de 43 anos: a terra vai resplandecer. Essa profecia viria a ser tragicamente traída por uma geração de políticos, eventualmente a mesma dos músicos em referência, que apostou em projectos de poder total, à custa da exclusão do outro e da destruição da terra que devia resplandecer.
*Este trabalho foi possível graças à colaboração da directora da discoteca da RNA, Bela de Carvalho, e da dupla de tias Jacinta Hamilton e Filomena Sapalo, além de António Clara e Madalena Alexandre, que muito facilitaram este encontro com as canções da Dipanda.

Fonte. Jornal de Angola 11 de Novembro de 2018

terça-feira, 10 de dezembro de 2019

Massano Júnior, o Rei dos Tambores: “A juventude tem feito coisas interessantes”

Importante figura da cena musical angolana, Massano Júnior celebrou mais um aniversário junto de amigos e familiares. O homem do Marçal nasceu no dia 10 de Novembro de 1948. Os seus aficcionados, desde Abril deste ano, mês em que foi lançado, perguntam invariavelmente: onde encontrar o álbum "Kizua"? O caderno Fim-de-Semana esteve à conversa com Massano Júnior e começou logo pela interpelação sobre o "paradeiro" da sua obra discográfica. O músico, com uma postura aberta, respondeu sem rodeios a todas as perguntas. Convidamos o caro leitor a mergulhar um pouco, com Massano Júnior, na história da música angolana 
Em Abril lançou “Kizua”, muito procurado e solicitado, que marca o seu regresso discográfico. Quais as razões da falta de disponibilidade da obra no mercado?
O disco foi uma iniciativa de meus familiares, que fizeram todos os esforços no sentido de materializar a gravação. Eu apenas procurei seleccionar os músicos da minha conveniência, com a ajuda do Dulce Trindade. Os meus familiares recorreram ao Jorge Cervantes, que esteve aqui e gravou nos estúdios Marimba.
É caso para dizer que o disco “Kizua” também apareceu de caxexe…
(Risos) Está sob responsabilidade dos meus familiares. Eles adoptaram uma política em relação ao disco que eu desconheço e eu prefiro manter-me a espera de outros desenvolvimentos.
“Kizua” é um filho que não está sob sua responsabilidade?
Está entregue em muito boas mãos. Eles estão a dar o seu melhor. Quanto à distribuição só eles sabem, mas vou ter de estar um pouco mais por dentro, para satisfazer os pedidos. Aos meus admiradores prometo que iremos agilizar o processo, não aguento mais as solicitações e as exigências que me são feitas.
Olhando para a produção do disco, de facto, a sua família esteve muito envolvida. A que se deveu isso?
Sou o patriarca dos Massano e sempre tive uma boa relação com os meus familiares. Isso até está reflectido na canção “Anami”. Perdi os meus pais cedo e, como mais-velho, tive de cuidar de todos, trabalhar duro. Talvez por isso o gesto deles. E também por isso não estou preocupado com as questões administrativas. Eles são pessoas suficientemente formadas, tudo o que sou também devo aos meus filhos e irmãos. Eles organizaram a apresentação do lançamento do disco e ofereceram aos presentes.
O que podemos encontrar no álbum?
Apenas recordações de temas antigos que marcaram a minha carreira. No próximo, que estou a preparar, penso apresentar temas novos, porque nunca deixei de compor. Isto está na alma…
E “Minga” é o tema de abertura do disco que também retoma “Anami”… Sim. “Minga” está sem aquele toque do órgão do Tony Galvão, mas penso que está com o mesmo sentimento. O tema “Anami” é dedicado aos meus filhos. Foi numa época em que acabava de chegar do exterior, depois de os ter deixado. A vida estava difícil e eu tentando estabelecer-me…
Falando em “Anami”, há tempos o jornalista Gilberto Júnior, na rubrica “Ripiti”, do “Poeira no Quintal” da RNA, colocou a tocar uma das primeiras, e pouco conhecida, versão deste tema com andamento reggae…
Sim, foi feita no tempo do Instrumental 1º de Maio. Os arranjos foram do Teddy e do Mogue. O Instrumental 1º de Maio era uma formação versátil e tocava tudo.
Assim como o seu lado sentimental…
Sim. Esta é a minha marca melódica, mas também posso sair dela. Tenho canções mais dançantes como “Sunga Sunga”.
Músicas novas? E com quem vai trabalhar?
Mais uma vez com o Dulce Trindade, que é um músico que eu admiro.
É impressão nossa ou está sempre rodeado por músicos do Marçal, Rangel e Bairro Operário? Os do Prenda não contam?
Vocês gostam de problemas. O Zé Keno passou pelos Africa Show e eu cantei numa homenagem aos Jovens do Prenda. Pode parecer coincidência. O Zeca Tirilene é uma sumidade, toquei muitos anos com ele e grande parte dos meus sucessos têm o seu toque.
Aquando da apresentação do seu disco, outros artistas interpretaram as suas músicas…
Mas eu cantei quatro músicas. Como a produção esteve a cargo do Dionísio Rocha, eu tive que respeitar.
O que mais temos nesta obra? Tirando a parte musical, consta um DVD produzido pelo incansável Nguxi dos Santos, que também fez a cobertura, pela Internet, do lançamento do disco.
Falar de Massano Júnior remete-nos ao movimento cultural do tempo das turmas em bairros como Rangel, Marçal, Operário e outros. Como foi que tudo começou com o miúdo do Marçal?
Fui inspirado pelo Mangololo, que era um grande tamborista. Pertenci à turma dos Vagabundos do Bairro Marçal, com o Zé Maria, Victor da Poupa Russa, Zé Moranha, Kavulanga e outros, que infelizmente já morreram. Depois juntei-me ao Kipuca e formei Os Kipukas e os Seus Malambas. Em 1967 Dionísio Rocha foi buscar-me ao Rangel, onde morava, para participar nos Negoleiros do Ritmo, em 1968. Posteriormente entro para a vida militar e formo então o África Show.
Uma curiosidade.
Os Negoleiros do Ritmo tinham como tamborista o grande Joãozinho Morgado e Massano Júnior era a outra fera. Poucos imaginam que tenham partilhado os tambores no mesmo grupo e na mesma época?
Parece mentira, mas é verdade. Formámos uma boa parelha e entendíamo-nos muito bem. Quem sabe voltaremos a repetir para a actual geração…(risos).
É incontornável falarmos do África Show…
Sim. Actualmente tem dois sobreviventes, eu e o Zeca Tirilene. Nós introduzimos o órgão na música angolana. Teta Lando, Tony Galvão e Belmiro Carlos são nomes que passaram pelo África Show.
É verdade que o África Show tinha um outro tipo de público e que apenas tocava no asfalto?

(Foto: D.R.)
Infelizmente algumas pessoas diziam que éramos da elite, mas nós tocávamos em todo o lado, Sambizanga, Rangel, enfim. Mas éramos assim rotulados. Éramos todos do Marçal e do Rangel e não sei qual seria o mal de levarmos a nossa música para o asfalto. Penso que havia toda a necessidade, para os portugueses, terem contacto com os nossos ritmos. Olha que já naquela altura o Elias dya Kimuezo era o baluarte, por isso procurávamos exportar a nossa música para o outro lado. O África Show também teve uma forte componente de grupo de acompanhamento, por exemplo, com o Zé Viola. E outros.
Enquanto isso, o tamborista Massano Júnior também se destacou como um grande intérprete…
Exactamente, por causa do espiritual angolano…
Espiritual angolano?
Tudo por uma questão sentimental. Quando comecei a cantar acabava de perder a minha sogra, Minga, e é assim que a minha primeira composição foi dedicada a ela.
Neste conjunto Massano Júnior, com um passado bem assente na música angolana, junta-se a instrumentistas de uma escola diferente, a do então Zaire. Como foi a adaptação destes aos nossos ritmos? Eram músicos excelentes e dedicados.
Por exemplo, hoje não se encontra um solista como o Teddy Nsingi, nem um baixista como o Mogue. São casos raros. Olha que nos grandes concertos deste país o Teddy é uma presença constante. Ele é um estudioso da música angolana.
E aquela imagem do Massano Júnior com os quatro tambores em palco, era apenas estilo?
Não. Eu tocava mesmo os quatro tambores e ainda toco hoje, se for necessário.
Em que circunstâncias entra no Instrumental 1º de Maio? Quando regresso ao país o Sabú Dinis, na altura, era um responsável da UNTA. Ele fez a selecção dos músicos, conhecia o meu passado como artista e a situação em que me encontrava.
É engraçado como as mudanças no país também mudaram a designação do grupo…
Passámos para Semba África porque eram muitos elementos no Instrumental 1º de Maio.
nestes espaços.
“Meninas de hoje”, um dos temas mais marcantes de Massano Júnior, chegou a esta nova geração pela versão de Caló Pascoal. O que achou da concepção rítmica? Não fugiu ao espírito e não criou grandes invenções. Ele é um artista versátil, sinceramente senti-me lisonjeado. Coisas desta natureza merecem o meu apoio.
Parece que é da mesma opinião do seu falecido amigo e companheiro Teta Lando, quanto às versões, feitas pelos jovens, de sucessos do passado. Isso mesmo quando elas são feitas sem uma comunicação prévia?
Penso que não custa nada pedir a autorização. Agora, quanto a interpretar a minha música, podem interpretar livremente, mas, repito, não custa nada pedir. Por outra, saibam que ninguém está proibido de cantar a música do outro, há apenas procedimentos a seguir, como o facto de anunciar o autor, e outros, à luz dos direitos autorais.
Há jovens que quase vivem de sucessos de canções antigas. Como vê isto?

José Massano Júnior: “Hoje não se encontra um solista como o Teddy Nsingi, nem um baixista como o Mogue. São casos raros. Olha que nos grandes concertos deste país o Teddy é uma presença constante. Ele é um estudioso da música angolana”. (Foto: D.R.)
Também tem o seu lado bom. Olha que, por vezes, dão-nos trabalho e trazem-nos para um público novo. Dão a conhecer artistas e canções que os mais novos, de outro modo, dificilmente conheceriam, ou não conheceriam mesmo. É também assim noutras paragens. Mas é lógico que devem criar bastante. Olha, faço uma vénia aqui ao Yuri da Cunha, que pegou em temas de Artur Nunes e os pôs novamente na ribalta. É louvável e merece todo o nosso elogio. Jovens como o Yuri da Cunha estão a levantar defuntos.
Então a nossa música está no bom caminho?

Massano Júnior, sobre a UNAC-SA: “É uma instituição pobre e só Deus sabe como encontrei aquilo. Usei recursos próprios enquanto aguardávamos a verba, o orçamento que o Estado dá através do Ministério da Cultura, que não chega. Com a ambição de meia dúzia de indivíduos chegámos a esta situação, e lá até existem pessoas que nem sequer são artistas. Eu sempre fiz parte da UNAC e passei à presidência à luz dos estatutos, com a saída do presidente eleito, o Dr Arnaldo Calado. Gostaria de referir que o Belmiro Carlos fez muito pela instituição”.
(Foto: D.R.)
Acho que sim. Nos aspectos técnicos a juventude tem feito coisas interessantes na música angolana. É preciso que tenhamos a coragem de dizer que sem os jovens músicos isto não vai sobreviver, não seremos apenas nós, artistas antigos, a fazer isto.
Mas, kota Massano, quando olhamos para o panorama vemos que existem pouquíssimos executantes de dikanza e de tambores, instrumentistas que são determinantes, não obstante o grande numero de intérpretes…
Sim, são a base da nossa música. A dikanza praticamente desapareceu, ela que já era um instrumento frágil. Há aí uma nova geração de tamboristas que é de se lhes tirar o chapéu, como o Correia da Banda Movimento e o Chico Santos, Recordo que o Julinho quase já não toca, o Joãozinho Morgado continua no activo e eu às vezes toco… Apesar deste quadro, sou positivo.
Mesmo a contragosto, a UNAC não tem como não entrar nesta conversa… Sim. Infelizmente optei por afastar-me da direcção, porque sou um indivíduo que não gosta de confusões, não que eu fuja à luta mas prefiro evitar certas coisas.
É uma instituição pobre e só Deus sabe como encontrei aquilo. Usei recursos próprios enquanto aguardávamos a verba, o orçamento que o Estado dá através do Ministério da Cultura, que não chega. Com a ambição de meia dúzia de indivíduos chegámos a esta situação, e lá até existem pessoas que nem sequer são artistas. Eu sempre fiz parte da UNAC e passei à presidência à luz dos estatutos, com a saída do presidente eleito, o Dr Arnaldo Calado. Gostaria de referir que o Belmiro Carlos fez muito pela instituição.
Mais uma vez, obrigado pela disponibilidade…
Eu é que agradeço. Afirmo que aceitei abrir-me porque tive boas referências tuas. Antes falei com alguns amigos que me disseram que valia a pena conversar contigo. Também gosto dos destaques do caderno Fim-de-Semana do Jornal de Angola. Estarei sempre à vossa disposição.

“Gosta de congregar e mitigar sofrimento”

” Kizua” não é apenas um trabalho áudio. A obra está acompanhada por um DVD produzido por Nguxi dos Santos, onde Massano Júnior, familiares e colegas falam do seu percurso. Do documentário, apresentamos aqui alguns depoimentos, onde os intervenientes não falam apenas do autor, mas ajudam a compreender o movimento cultural envolvente.
Massano Júnior – “Fiz os meus estudos no Lobito. De regresso a Luanda instalei-me no Marçal… Participava nos recitais organizados pela Albina Assis e ganhava sempre… Fui convidado pelo Dionísio Rocha para substituir o Joãozinho nos Negoleiros do Ritmo e começo a ver uma luz no fundo do túnel na minha vida musical… Recebi um convite do Duo Ouro Negro e, na companhia de Carlitos Vieira Dias e do baixista Mário Bento, participamos na revista Blackground Internacional, uma companhia de teatro. Depois regresso e crio o África Show… Muitos não queriam a introdução do órgão, mas eu sempre disse que a música devia evoluir e que era necessária a introdução de instrumentos modernos… Eu era tratado como o espiritual e o África Show o conjunto espiritual angolano.”
General João Pereira Massano (irmão) – “Perdi o pai muito cedo e ele cuidou de mim, é o único pai que tive… Ele é o pilar em que eu sempre me revi, é um exemplo. Estou com ele e com ele vou até às últimas consequências.”
Dionísio Rocha (músico) – “Ele cria o África Show numa fase em que os elementos dos Negoleiros vão para a tropa. Nessa época de pausa, ele forma o seu próprio conjunto.”
Carlos Lamartine (músico e compositor) – Massano quando chegou do Lobito estava interessado no movimento cultural… O África Show era um conjunto modernizado.”
Manuelito (músico) – “Ele funda o conjunto com intenção de criar um estilo novo… Ele preferia espaços onde pudessem compreender a interpretação do reportório do grupo.”
Santos Júnior (músico) “Pertencemos ao grupo Estrelas Negras… Ele ajudou muito os elementos do África Show, já tinha um certo protagonismo junto das casas de equipamento musical, foi ele que adquiriu o primeiro aparelho do grupo. Para segurar os membros, comprava motorizadas para se deslocarem aos recintos de espectáculos… Tocava com os pés, a cabeça… Era chamado Rei Massano das Tumbas…”
Galiano Neto (músico) “É importante que indivíduos como Massano gravem e deixem obras, porque não são muitos os que ainda podem deixar-nos o legado e a verdade da música angolana.”
Dom Caetano (músico) – “Gosta de congregar, de apaziguar, gosta de mitigar sofrimento.”
Caló Pascoal (músico) Foi importante estar junto com Massano e sentir a alma do autor… Eu pretendia que ele interpretasse a música “Meninas de hoje”. Levei-lhe a gravação com a minha voz-guia e ele preferiu que esta ficasse.” (Jornal de Angola)
Por: Analtino Santos

Noites de escangalho com Ary

Duas noites de escangalho, com Ary no palco do Show do Mês, deixaram os “showistas” rendidos ao seu perfume musical. O roteiro musical começou com “Paga que paga”, que fala do indivíduo que era bom pagante fora de casa enquanto os filhos no lar nada tinham, e encerrou com o tema sobre violência doméstica “Betinho”, com outros, pelo meio, a destaparem outras vivências do quotidiano.



Fotografia: DR
A importância de uma apresentação familiar no relacionamento esteve patente na música “Tónico” e o ciúme e o medo em “Não me faças desistir”. Duas das primeiras canções da carreira de Ary não “escaparam”: “Meu grande amor” e “Não pergunta muito”, também conhecida por “Meu patrão”, proporcionaram um recuo de cerca de uma década.
Mig, convidado, fez uma canjinha no seu grande sucesso “Maka mami”. Ary, vestida a bessangana, devidamente “produzida” pelo grupo carnavalesco União Mundo da Ilha, partilhou também o palco com os Nguami Maka, grupo de música ancestral, que deram o seu toque típico em “Nguxi” e “Manazinha”, dois temas muito conhecidos nas vozes de Belita Palma e Dina Santos.
Acácio pisou também o palco e, sem a companhia de Ary, brindou o público com “Siluvangui” e “Abigbedoto”, adaptações de temas africanos que conquistaram as pistas angolanas. Ary, de regresso ao palco, revisitou temas de outros, nomeadamente “Tá amarrado”, composição de Kintino, “Deception” de Lutchiana Mabulo e “Despedida de lar”, de Beto Cruz.
Seguiram-se momentos em que Ary recuperou músicas que definiram a sua carreira: “Monami”, “Mona kinguixi” e “Candinha”, esta original de David Zé, que era a canção de ninar do filho da cantora. A interpretação de “Nem às paredes confesso”, “Para uso exclusivo” e “Amor roubado”, ou seja, o fado de Amália Rodrigues, o samba de Alcione e a balada do moçambicano Guilherme Silva, provou a versatilidade de Ary.
O tema “Assim é que é” teve uma recepção tímida por parte da plateia, que reagiu de modo diferente em relação aos sucessos “Escangalha”, “Carta de amor” e “Funge na cachupa”, cantados em uníssono e com forte vibração.
Na primeira noite era visível o esforço da artista para ajustar-se ao formalismo da sala, “kanjonjando” o seu lado irreverente. Mas na recta final surgiu o momento, como diriam os brasileiros, “liberou geral”, com muita festa e espontaneidade, as marcas da actuação de Ary: a miscelânea que juntou “Ngapa” dos Irmãos Almeida, “Esse madié” de Eduardo Paim e “Betinho” da própria Ary, não deixou ninguém indiferente.
Yark Spin foi o solista em destaque, na ausência do Mestre Teddy. Pepelo fez o que habitualmente tem sido responsabilidade de Yark Spin e também solou em alguns temas, numa banda onde Mayo Bass preencheu as cinco cordas de Mias Galheta, o principal baixista do Show do Mês. Os jovens Benny nos teclados, Alexandre na percussão, o trio dos coros Raquel Lisboa, Neide da Luz e Tchilo, a secção de cordas, e Jack na bateria, comprovaram a aposta da produtora Nova Energia em jovens instrumentistas, sob o olhar atento do experiente percussionista Xico Santos e supervisão do trio de sopristas cubanos.
Constatação
Não é fácil montar um concerto com uma artista com tantos sucessos e parcerias marcantes. Titica partilhou criativamente com Ary “Pelo menos 50”, Baló Januário produziu “Papá fugiu”, que consagrou Ary ao fazê-la conquistar, pela segunda vez, o Top dos Mais Queridos. Heavy C foi determinante na carreira da musa ao assinar sucessos como, por exemplo, “Não me faças desistir”. Ary fez dueto com Yuri da Cunha em “Não pergunta muito”. Tudo isso e as parcerias da cantora, em estúdio ou em palco, com Puto Português, Karina Santos, Paulo Matomina, Kyaku Kyadaff, e outros, dão prova da sua extrema sociabilidade e extroversão. Que tem reflexos, naturalmente, na diversidade, abertura e plasticidade da marca Ary.
A artista tem os seguintes discos publicados: “Sem substituição”, “Crescida mas ao meu jeito” e “10”.
Fonte- Jornal de Angola